terça-feira, 26 de outubro de 2010



"PSICOTERAPIA BREVE"
MAIS RÁPIDA DO QUE A PSICANÁLISE DE DIVÃ.
A terapia breve atrai os pacientes.Numa época em que a comida fica pronta em três minutos de microondas e distâncias intercontinentais podem ser percorridas em horas, não mais dias, ainda não se inventou uma solução instantânea para os males da alma. A dor psíquica obedece a um outro ritmo, mais vagaroso. Em busca do alívio imediato para pessoas que não querem — ou não podem — apostar suas esperanças de cura em anos a fio no divã de um psicanalista, está ganhando espaço um novo tipo de tratamento, oferecido em muitos consultórios, a psicoterapia breve. O alvo são os pacientes com problemas de relacionamento pessoal, desemprego ou depressão, que não conseguem sair da crise sozinhos, querem ajuda profissional, mas não têm tempo, paciência ou dinheiro para as intermináveis terapias clássicas. Na psicoterapia breve o número de sessões varia entre doze e trinta, e a duração do tratamento nunca ultrapassa um ano. Quase todas as correntes da Psicologia criaram uma linha “breve” de terapia. Hoje em dia pode-se fazer, em versão reduzida, psicodrama, terapia comportamental, terapia cognitiva, de família ou em grupo. Mas o que mais está atraindo profissionais e pacientes é a terapia breve com base na psicanálise — o tratamento dos distúrbios da mente derivado dos princípios teóricos de Sigmund Freud. Para os freudianos ortodoxos, isso é uma heresia. Tratar a intrincada mente humana de acordo com os princípios da complexa teoria freudiana em meses? A prática tem mostrado que isso é possível, desde que se aceitem determinados limites. As psicoterapias breves concentram seu foco em apenas um aspecto da vida do paciente. Enquanto o psicanalista tradicional procura resolver os traumas e neuroses por meio de um mergulho nas profundezas da mente, na terapia breve a meta é acabar com o sintoma que levou o paciente ao consultório, nada mais. “O terapeuta seleciona os problemas do paciente que serão tratados e negligencia os demais”,eu particulamente atendo muito mais que 20 pacientes por dia em minha clinica de Psicologia — todas por psicoterapia breve. Ninguém deixa de ser tímido ou impotente em meses, mas pode-se aprender a suportar melhor o fato de ser portador de uma doença incurável. Pior seria não ter acesso a tratamento algum. As questões que só Freud explica continuam sendo levadas ao divã. A terapia breve cuida de problemas mais imediatos — crises conjugais, desajuste no trabalho, dilemas da meia-idade, rebeldias da adolescência, depressão por algum acontecimento recente. A técnica serviu com precisão para o executivo Nelson guidorizzi, de 50 anos. Ele foi tentar resolver uma questão bem específica. Em cinco meses de tratamento psicológico, um tempo curto para o mundo da mente, ele resolveu o problema que o angustiava. Alguns meses antes, ele sofreu um acidente no qual o carro que dirigia se chocou contra um poste, provocando a morte de uma amiga que estava no banco de trás.Nelson, na época mais jovem, estava convencido de que não tinha culpa pela tragédia. Mas andava cabisbaixo e ficava inseguro ao encontrar conhecidos porque imaginava que eles o consideravam um assassino. Festeiro por natureza, passara a levar uma vida reclusa — temia que, se alguém o visse com um copo na mão, logo deduziria que ele estava bêbado na noite do acidente (não estava). “Retomei a confiança em mim mesmo e aprendi a dar menos importância ao que os outros dizem”, conta Nelson. “Amadureci muito por causa do acidente e talvez tenha amadurecido melhor por causa da terapia.” Cara a cara — O encurtamento do tempo do tratamento é uma polêmica antiga entre os terapeutas. As primeiras propostas de acelerar o processo de análise surgiram já na década de 20. Nenhuma delas recebeu a chancela de Freud, que atendia seus pacientes na base de seis sessões por semana. No entanto, alguns psicanalistas começaram a procurar uma resposta para a necessidade de uma solução rápida para pacientes com problemas específicos. Surgiram, então, algumas técnicas de terapia breve, das quais a mais utilizada é a psicodinâmica. Trata-se de um método diferente da psicanálise clássica. Em vez de deitar-se no divã e passar a maior parte da sessão num falatório desordenado, o paciente fica cara a cara com o terapeuta, que muitas vezes encaminha a conversa. Mas a referência teórica do psicólogo continua ancorada nos ensinamentos de Freud. Ou seja: o psicólogo interpreta a psique humana com base nos conceitos de consciente e inconsciente, acredita na existência do complexo de Édipo e fica atento aos sonhos e aos lapsos. “A psicoterapia breve não é superficial”, explica Dra.Suzeth de Carvalho,profissional nesse novo tipo de tratamento no Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas. “Ela é profunda, mas numa única questão.” Os psicanalistas mais ortodoxos acham que é difícil identificar a causa de um conflito psíquico em pouco tempo. O perigo, segundo eles, é que, na tentativa de suprimir isoladamente um sintoma, o terapeuta acabe por provocar um desajuste ainda mais grave. Os adeptos da terapia breve argumentam que, nos tempos atuais, não se pode querer aplicar a psicanálise tradicional para todos que os procuram. A escassez de tempo não permite. Muitas vezes o dinheiro também influi. Os profissionais cobram o mesmo preço por uma sessão em ambos os casos — 100,00 reais, em média. O que torna a terapia breve mais econômica é o fato de que esse valor é desembolsado durante alguns meses, e não anos, muitos anos. “Oferecer às pessoas apenas a psicanálise como alternativa de tratamento me parece o mesmo caso de um alfaiate que faz somente um modelo e tamanho de roupa”, diz Ryad Simon, professor do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo e defensor da terapia breve. “Se o alfaiate for rigoroso a esse ponto, o cliente sairá de seu ateliê completamente nu.” Resultados inegáveis — A secretária desempregada Vera lucia dos Santos, de 32 anos, sabe que seu drama psicológico é bem mais grave do que uma terapia breve pode dar conta. Mesmo assim, acha que os três meses de tratamento lhe fizeram muito bem. Vera tem dificuldade de relacionamento com a mãe, que ficou viúva quando ela era criança e teve de trabalhar duro para criar a filha. A mãe a considera culpada por sua infelicidade e faz de tudo para atrapalhar o convívio de Vera com o marido. O terapeuta optou por não mexer no labirinto mãe-filha — um prato para uma vida inteira no divã. Em vez disso, concentrou-se na insegurança da paciente e na dificuldade que ela sentia para impor sua vontade perante a mãe. Deu certo. Vera reforçou a auto-estima, tornou-se uma pessoa menos depressiva e mais independente. “A relação com a minha mãe não melhorou, mas agora evito um contato maior”, declara. “Só a vejo a cada quinze dias e não deixo que ela vá a festas da família do meu marido.” Com a terapia, Vera deixou de tomar antidepressivos. “Se eu pudesse faria análise a vida toda. Mas não posso. É muito caro.” No Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo, o número de pacientes triplicou desde que a instituição passou a oferecer também a psicoterapia breve. De acordo com uma pesquisa feita, a terapia de curta
duração é usada em praticamente todas as clínicas ligadas a escolas de Psicologia que fazem atendimento à população. Isso torna o tratamento acessível a um número maior de pessoas, mas cria também alguns problemas. Nesses locais, em geral quem atende são alunos, naturalmente com pouca experiência e ainda em aprendizado. Isso diminui a qualidade do atendimento. Mesmo assim, os resultados são inegáveis. A professora Loreta Maria,tinha cansaço, stress, insônia, úlcera, gastrite e uma enxaqueca que a levava freqüentemente ao hospital. Era tímida e insegura. Foi parar na rede pública, atendida por uma estudante de Psicologia, sabendo que tinha o prazo de um ano para a terapia, com duas sessões por semana. “Mudei completamente minha maneira de viver”, conta Loreta, que já concluiu o tratamento. Seus sintomas desapareceram. “Só o fato de ter alguém para escutar nossos problemas já é algo encantador.” Entre o divã e a poltrona, conheça as diferenças básicas entre a psicanálise e a psicoterapia breve Psicanálise Objetivo: Ajuda o paciente a conhecer suas neuroses para livrar-se ou aprender a conviver com elas. Explora o universo psíquico como um todo, para promover um autoconhecimento profundo Indicação: Alguns psicanalistas acham que não se deve iniciar a análise em momentos de crise emocional Tipo de paciente: Todos podem beneficiar-se, com exceção dos doentes mentais Duração: Recomenda-se pelo menos duas sessões semanais. Não há prazo definido, mas dificilmente dura menos de dois anos, podendo demorar quatro, oito ou mais Psicoterapia breve (de fundo psicanalítico) Objetivo: Pretende acabar com o sofrimento causado por algum fato específico ou uma única característica da personalidade da pessoa Indicação: Situações específicas como crises matrimoniais, desajuste no trabalho, sofrimento por algum acontecimento recente etc. Tipo de paciente: Pessoas capazes de levar uma vida normal e de superar problemas em prazos curtos Duração: Em geral, entre doze e trinta sessões, no máximo duas vezes por semana. Nunca ultrapassa um ano.

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